terça-feira, 27 de novembro de 2018

O Tigre

O tigre é feroz, mas a mulher é mais... Sei do que falo. Em tempos remotos, estando eu a vadiar neste calhau redondo e molhado de mar, cruzei-me com um tigre. Foi ao nascer do dia no Parque Natural de Ranthambore, no Rajastão, uma antiga reserva de caça de um Marajá Foi uma coutada de luxo de um daqueles marajás que vivia milionário do oficio de lamber o cu ao Ingleses e reprimir o seu próprio povo. O governo da india fez um parque natural onde é possivel caçar bichos de maquina fotográfica. Tinha chegado na vespera na camioneta da carreira. Viajava com uma mulher que não estava tão receptiva a ideia de conhecer a India profunda quanto eu. Chegamos cansados, alojamos-nos numa tenda alugada nas traseiras de um hotel. Comemos, dormimos, comemos e saímos para ver os tigres. Ainda de noite, da reserva veio um jipe de caixa aberta, onde embarcamos juntamente com um casal de belgas equipados com camaras e aparelhos que davam para filmar no banco do carro a odisseia do espaço, ambos vestidos de camuflado e lavadinhos de fresco. Lembro-me que estava frio e nós não tinhamos tomado banho porque não tinhamos água quente. Seguimos umas duas horas por caminhos de terra. Vimos passaros esquisitos, javalis, veados, texugos e bicheza varieda. Finalmente o carro parou à entrada de uma clareira onde um javali chafurdava na lama de um charco. O guia fardado de caçador e turbante avisou no seu ingles "made in India" que o tigre do qual seguiamos as pegadas há horas, estava ali escondido, do outro lado, nos arbustos. Foi então que se ouviu o rugido. Um rugido petreficante que nos deixou a todos paralisado. Incluindo o javali. Os belgas dispuseram o equipamento. Eu pensei, porra, vou tirar a foto da minha vida para mostrar ao puto. O meu filho teria nessa altura uns cinco ou seis anos... Tinha-me pedido um Tigre e eu dei-lhe um gato... Estava na hora de me redimir e "levar" o tigre pró puto. Sem fazer barulho desci do jepe e aproximei-me da clareira de maquina na mão. Silencio total. Até os pássaros se calaram para ver o que ia acontecer. E aconteceu: o rugido que soou naquele momento, pode não ter sido tão intenso como o do tigre... Mas veio em elevados decibeis e em portugues. -- Foda-se Helder, estou farta desta merda. Venho práqui sem condições nenhumas, dormir numa tenda, sem agua quenta, a ter de fazer cócó num buraco, comer caril de manha, à tarde e à noite, a levantar-me de madrugada e apanhar frio...e para cumulo, agora estás com esta palhaçada de quereres tirar a fotografia ao Tigre! Sabes a quantas horas estás do hospital mais proximo? Tou farta das tuas loucuras Helder! Já chega foda-se! Tou farta. Fartinha! Isto não está a resultar! Tudo isto, foi gritado ecoando no silencio da selva. De facto não estava a resultar. Mas o que tambem é um facto, é que a gritaria não só safou o javali que despertou da parelisia, mas tambem fez fugir o tigre a sete pés, provando definitivamente que em termos de bichos perigosos nada chega à agressividade de uma mulher a quem tiraram a possibilidade de usar o secador. O guia do parque, mais tarde, na garagem onde lavava a lama dos peneus do jipe onde partilhamos chá e vinho do porto, e falavamos de animais e da vida, deu-me um conselho precioso: arranja outra mulher que esta que tens é muito barulhenta! Quem se lixou no meio disto foi o tigre que fugiu sem tomar o pequeno almoço, e os belgas que tiveram de voltar a acordar cedo para tentaram o filme no dia seguinte.