quinta-feira, 2 de maio de 2019

Joana ardida

A Joana sempre foi uma rebelde. Dizem que viveu virgem e que usa apenas como peça de roupa uma túnica de linho sobre o seu corpo nu. A pele das coxas com o cavalo em esforço entre as pernas despidas. O rosto em êxtase e a espada na mão. Uma espada grande de ferro e aço com punho pequenino para o seu pulso adolescente. Nascida camponesa, na terra de Arc, sem outra fortuna além de si própria. Teve a força e a genica necessária para reunir os franceses e quase quase vencer a guerra contra os ingleses. Uma daquelas guerras antigas e longas. Uma guerra de cem anos. Quando falava soprava vento e quando levantava a espada sentia—se o furacão do seu querer. Corações e cabeças tombaram de paixão e desejo pela Joana. A Joana quase—menina, virou a Joana quase—mulher. Mulher, jovem, bonita, carismática e inteligente, combinação perfeita para lhe estragar a vida! Meio caminho andado para a fogueira dos donos do mundo. O resto do caminho fez a galope no seu cavalo. Julgaram—na por bruxa. Não se sabe se era, se não era. Dizem que as há. Depressa a condenaram e mais depressa executaram a sentença. O fogo que a matou aqueceu uma multidão de basbaques e satisfaz o perverso desejo de morte de nobres e padres. Acenderam a chama que em Ruão. Ainda lá está o túmulo para confirmar que o que conto não é mentira. Depois, em cima das suas cinzas frias, acumulando opressão com humilhação fizeram da Joana Santa. Santa católica para rezar nas missas e pedir milagres. Não contentes, sempre os mesmos donos do mundo, trataram de amassar as suas cinzas e fazer do que sobrou um Símbolo Nacional e o patriarcado compensou a impotência de séculos com estandartes em seu nome Sempre que arde uma igreja, não resisto a imaginar a Joana, descida do seu cavalo e de túnica arregaçada, a brincar com fósforos para ajustar contas antigas. Que me perdoem os mais católicos.

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