sexta-feira, 5 de junho de 2020

Preto, magrebino, cigano, judeu, monhé

No inicio dos anos oitenta fiz uma viagem de carro com os meus pais. Foi no verão e estava calor. Atravessamos toda a Espanha e toda a França pela torreira de Agosto sem ar condicionado. Eramos quatro dentro do citroen sem ar condicionado. Fomos à Suiça visitar familiares emigrados. Pelo caminho fizemos alguma praia. O sol quente deixou-nos a pele castanha. Sobretudo a mim e ao meu pai. Quando chegamos à Suiça, iamos da cor que somos, cor da gente do sul. A cor da pele de quem está acima do Cabo da Boa Esperança e abaixo do Cabo da Roca. Uma manhã de sol fui com o meu pai às compras para o almoço numa terreola de labregos suiços. A puta da empregada da mercearia, quando o meu pai entrou comigo, reagiu como se tivessemos uma doença contagiosa ou se fossemos roubar-lhe a loja. Perguntou-nos de que país de Africa vinhamos, atirou-nos o pão para cima do balcão e correu conosco. O meu pai, que é mais educado e polido que eu, pagou o pão que comprou, agradeceu o troco e virou-lhe as costas. Eu nessa manhã aprendi o que é ser preto. Foram uns tres minutos dentro da mercearia, mas chegaram para perceber. Passaram-se quase quarenta anos sobre este episódio de ser preto por três minutos. Mas não me esqueci. Ao longo da minha vida, passei por muitos lugares. lugares onde fui estrangeiro. Muitos continuaram a confundir-me com arabe, outros com judeu. Fui cigano iberico para ciganos romenos. Romeno para bulgaros. Fui grego para turcos e turco para russos. Indiano, berbere entre argelinos e marroquino entre tuaregues. Brasileiro entre cubanos, cubano entre outros latinos. Muitos nomes, rotulos com bandeiras de países, nacionalidades, raças e etnias. Mas ninguem acertou na minha estranha etnia. Nunca ninguem foi capaz de me dizer que diser que raio raça é esta de ser um miudo preto a comprar pão com o pai numa mercearia damn suiça alemã.

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